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São minhas palavras perpetuando histórias. Revivendo as memórias de coisas que nunca vi. São minhas palavras que criam esse mundo misterioso, do real ao ficcional. COSTA, JOÃO. MEU PENSAR , CONTOS , PROSAS E POEMAS 2 (02) . Edição do Kindle.

segunda-feira, 9 de julho de 2018

TEMPOS DE TRAIÇÃO POSSUÍDOS POR AMBIÇÃO

TRECHO DO LIVRO.

Thomas voltou ao acampamento, não sem antes rasgar a sua roupa e provocar uns aranhões, para tornar sua mentira mais convincente, e esconder o relógio de ouro que poderia denunciá-lo. Horas depois, chegou trôpego e ofegante, tornando sua farsa convincente para alguns. Quase sem voz, pediu água ao nativo, que o amparou ao fingir desmaiar de cansaço na entrada do acampamento. Após alguns minutos, fingiu recobrar os sentidos, sentou-se na cama, contou uma história trágica do desmoronamento ocasionado por um escapamento de gás sulfúrico no interior da caverna, e, consequentemente, um terremoto, convencendo os outros membros da expedição da trágica morte de Lancarto e a impossibilidade de resgatá-lo com vida.
Dentro da caverna, após doze horas, Lancarto tentava recobrar os sentidos. Ainda atordoado pelo veneno da aranha, suas forças estavam praticamente esgotadas e tinha perdido a noção das horas e dos dias. A caverna só não era mais escura porque as estalagmites eram brancas como a neve. A explosão revelara uma quantidade de quartzo no teto da caverna. Um filete de água brotou na rachadura provocada pelo impacto do ar na parede da caverna. Com seus lábios secos ao extremo, talvez pelo efeito do veneno da aranha, ele rasgou a sua camisa, umedeceu e tentou matar a sede. Em seguida, com muito esforço, conseguiu girar a cabeça - seu pescoço estava enrijecido -, olhou para o teto e viu várias aranhas voltando a se aglutinarem no teto como se estivessem observando-o. Ele também as observou por minutos, pensativo, tentando recobrar a sua memória dos acontecimentos. Lancarto não as temia mais, escapara com vida do seu veneno e da explosão, e acabou por descobrir, graças à aranha que o mordera, que não poderia confiar em mais ninguém. Ele esboçou um sorriso irônico ciente da sua situação.
Três horas depois, Lancarto continuava sem reflexos, mas não quebrara por milagre nenhum dos seus ossos. Fisicamente debilitado, sua visão ainda permanecia turva, sua coordenação motora estava totalmente fora de ordem, e apesar do seu raciocínio estar voltando aos poucos, ele não tinha noção dos dias e das horas, e tentava economizar a pouca energia que lhe restava recostando sobre os escombros, procurando relaxar. Um cheiro de gás sulfúrico tomou conta do ambiente e o fez dormir, mesmo sem querer.
Dois dias se passaram quando Lancarto despertara com uma corrente de ar que ele não conseguiu localizar a origem. O cheiro sulfúreo havia desaparecido, mas uma dor de cabeça insuportável quase o enlouquecia, causando vômitos e uma cólica abdominal. Depois de alguns segundos de agonia, seu corpo começou a transpirar como se tivesse em uma sauna romana em cima de brasas vulcânicas. O calor dentro da mina se tornara insuportável, ele tinha conhecimento geológico da região, da origem da caverna, que por ser oriunda de um vulcão extinto ou adormecido por séculos ainda poderia haver resquícios de lavas nas profundezas.
Lancarto não tinha fobia a lugar fechado, mas tinha pavor de morrer queimado por conhecer bem a história de períodos medievais,e isso o apavorava, fazendo-o transpirar ainda mais. Felizmente, minutos depois sua dor de cabeça amenizou, e apesar de não ter esperanças de ser ouvido, ele gritou por socorro tentando chamar atenção, achando que alguém, que não fosse Thomas, pudesse estar tentando localizá-lo na caverna. A corrente de ar o ajudou a recuperar lentamente suas forças, e o único som que respondia aos seus gritos era o som do seu estômago, que roncava pela grande fome que se abatera sobre ele.

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