ACASO DO DESTINO
40
Jorge coça a cabeça e prefere não relatar os seus diálogos e
contratempos com a jovem pelo caminho até a cidade, resume o
seu relatório e diz de cabeça baixa, fingindo não ver o corpo da
patroa que ficava visível sob o robe:
– Não, Madame Albuquerque, isso foi fazendo a barba no es-curo que eu me arranhei com a navalha, mas pode ficar tranquila,
está tudo dentro do controle como a senhora recomendou. Eu a
deixei bem no centro como combinamos. E ainda dei um tempinho
e fiquei por algum minutosobservando sua reação e olhando, de longe, para ver se ela chamaria alguém para ajudá-la ou a polícia, mas ela simplesmente sentou na calçada e ficou de cabeça baixa, chorando por algum tempo e depois levantou-se e seguiu a Rua Rio Branco em direção à Candelária em meio a multidão que circulava. Ela talvez tente retornar para casa.
Soltando uma risada de deboche, disse Hortência, com ar dequiromante de ocasião:
– Isso é pouco improvável; eu conheço essa gente, Jorge. O que ela não conseguiu aqui em casa, com certeza vai tentar com outro tolo como o Marcos, que se encanta com essas carinhas de bonequinha, bonitinhas. Ele é um fraco, idiota, que pensa ser um garanhão, mas não passa de um idiota que não resiste à tentação carnal e, idiotamente, como vários que eu conheço nessa cidade,
cai na cilada dessas diabinhas com cara de anjinho. Hortência respira fundo, olha para a cara do motorista, em quem, apesar de estar olhando para o chão, percebe-se um sorriso no canto da boca. Então, como se estivesse recitando uma frase de uma peça teatral, como se estivesse no palco, ela gesticula e diz:
– Pobres homens ricos, meu caro Jorge, que não conhecem os sortilégios das mulheres, mas sorte sua que não corre o risco de cair nessa armadilha, e essa é uma das vantagens dos homens pobres, acho que elas só se entregam por amor.
Nenhum comentário:
Postar um comentário